quinta-feira, 24 de agosto de 2017

Quer viajar? Turismo em cavernas alia aventura e natureza


Passeio possibilita experiência sensorial diferenciada e contato com espécies raras
“Uma experiência de outro mundo”. Esta é a sensação ao visitar grutas e cavernas, na opinião da bióloga e espeleóloga Gisele Sessegolo. Ela é membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza e dedica sua carreira à conservação de grutas e cavernas brasileiras.
No Brasil há cerca de 16.369 cavernas já catalogadas, de acordo com dados do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Cavernas. Esse número cresce a cada ano, devido à imensidão do território brasileiro. No Paraná, por exemplo, no início do ano foram divulgadas dez novas cavernas encontradas por pesquisadores do estado, situadas no município de Ponta Grossa, na região chamada Escarpa Devoniana.
O mistério e a experiência que o visitante experimenta são diferentes de qualquer outra área natural e foi isso que atraiu Gisele para a espeleologia, que é o estudo de cavernas e grutas. “O ambiente é algo que parece de outro planeta e cada local tem uma particularidade própria. Por ser um ambiente mais isolado, os sons e a luminosidade proporcionam uma experiência completamente nova e exclusiva”, descreve. Espécies da fauna também são diferenciadas, e por vezes raras, pois algumas populações ficaram isoladas ao longo de anos no universo subterrâneo, se adaptando a esse ambiente.
Em Goiás, um dos cinco estados com maior concentração de cavernas no Brasil, está o Parque Estadual de Terra Ronca. Ao entrar no complexo de cavernas da cidade de São Domingo, o visitante tem a nítida impressão de estar em um cenário de ficção científica, pois os rios que atravessam as diversas cavernas da região fazem a terra estremecer e gerar barulhos que deram o nome ao local. O Salão dos Namorados, repleto de colunas de pedra e estalactites (formações rochosas em forma de cone que se originam no teto de cavernas), é uma das principais atrações do parque.
Na região sul, uma caverna que se destaca pela beleza natural e pela infraestrutura de visitação é a gruta do Botuverá, situada no vale do Itajaí (SC). A caverna, conta com diversos salões intensamente ornamentados com espeleotemas (do grego, "depósito de caverna". Nome de formações rochosas que ocorrem no interior de cavernas), e situa-se em meio a um remanescente de Mata Atlântica que permite também caminhadas.
Refúgios naturais, as cavernas também abrigam vestígios arqueológicos deixados pelos nossos antepassados. Os destaques estão em Altamira, na Espanha, chamada de a “capela Sistina da arte rupestre” pela imprensa mundial. No Brasil, o Parque Nacional de Sete Cidades, no Piauí, é considerado patrimônio cultural da humanidade pela Organização das Nações Unidas (ONU), pois abriga a maior concentração de vestígios pré-históricos já encontrados nas Américas.
Turismo e sustentabilidade
Por muito tempo, visitar cavernas e grutas significava desbravar o local, quebrar a ponta das formações rochosas para levar de lembrança e deixar o nome ou uma marca nas paredes dos gigantescos salões naturais. Isso aconteceu de forma extrema tanto no Parque Estadual de Vila Velha, em Ponta Grossa, no Paraná, como no Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira (Petar), em São Paulo, além de muitos outros lugares do País. Nesses locais, os órgãos responsáveis decidiram realizar uma intervenção com a proibição de acesso ao público. Apenas depois da implantação de um plano de manejo apropriado é que esses espaços foram liberados novamente para visitação.
De acordo com a bióloga Gisele Sessegolo, visitar cavernas é um encontro único entre ciência e aventura, mas, se não for feito da maneira correta, pode acarretar danos irreparáveis ao meio ambiente. “O turismo de aventura deve ser sustentável e precisa ser bem avaliado e desenvolvido, já que a apropriação mal planejada desses ambientes causa impactos negativos e irremediáveis. Quando bem planejado, o passeio proporciona desenvolvimento local, experiências únicas aos visitantes e uma ligação muito mais forte com a natureza”, analisa.
A orientação, segundo ela, é que haja uma avaliação da capacidade turística de uma caverna, em relação às possibilidades logísticas de acesso com o menor impacto possível ao meio ambiente. “Se nessa conta o saldo for positivo, então vale a pena liberar o acesso ao público, do contrário, nós e o meio ambiente só temos a perder”, pondera. O recomendado é que exista uma passarela de acesso para isolar o chão e garantir a segurança dos visitantes, ao mesmo tempo que permite uma experiência sensorial diferenciada.
A Gruta do Lago Azul, cartão postal da cidade de Bonito (MS), é um ótimo exemplo que alia turismo e conservação. O passeio dura cerca de duas horas e leva o visitante por uma trilha e uma escadaria que passam por diversas formações rochosas até chegar ao lago, que tem mais de 87 metros de profundidade. A água cristalina encanta por seu tom azulado que contrasta com as paredes da gruta. O passeio é seco, já que por questões ambientais e de segurança não é permitido mergulhar. Por sua fragilidade e beleza, a área foi transformada em unidade de conservação.
Desenvolvimento + conservação = turismo sustentável
A Organização das Nações Unidas (ONU) declarou 2017 como o Ano Internacional do Turismo Sustentável para o Desenvolvimento. O objetivo é promover o turismo nacional e internacional, bem como valorizar a cultura e o patrimônio dos povos de todo o mundo. O Brasil tem destaque nessa modalidade, pois oferece diversas opções de passeios que aliam diversão e sustentabilidade.
De acordo com a Organização Mundial de Turismo (OMT), o turismo sustentável é aquele que alia o desejo dos turistas de conhecer novos espaços e ter experiências diferenciadas ao desenvolvimento local e proteção do meio ambiente. Para a gerente de projetos ambientais da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza e membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza, Leide Takahashi, o turismo sustentável ocorre em cadeia e é responsabilidade de todos: governo, empresários e turistas. “Ao visitar um lugar, é preciso ter cuidado com o impacto que pode ser gerado. Não se trata apenas de separar o lixo. É preciso analisar seu comportamento e se adequar à cultura local”, comenta.
Algumas dicas são: reduzir a produção de lixo e não deixar resíduos nos locais visitados; não retirar nada do ambiente (a não ser fotos); preferir produtos locais e valorizar o comércio da região para ajudar no desenvolvimento e geração de empregos na região visitada. Estudar o local e o roteiro também ajuda a economizar dinheiro e otimizar recursos. Escolher hotéis ou pousadas próximos do local de interesse pode eliminar a necessidade de um carro, por exemplo, o que reduz a emissão de poluentes. Levar sacolas retornáveis na mala e poucas opções de roupas, mas que combinem entre si, também são atitudes sustentáveis que os turistas podem adotar.
Ou seja, não é preciso viajar somente para áreas naturais para praticar o turismo sustentável, mas sim se atentar para pequenas mudanças de atitude que podem ser feitas em qualquer lugar, desde uma grande metrópole até uma caverna.
*Gisele Sessegolo e Leide Takahashi fazem parte da Rede de Especialistas de Conservação da Natureza, uma reunião de profissionais, de referência nacional e internacional, que atuam em áreas relacionadas à proteção da biodiversidade e assuntos correlatos, com o objetivo de estimular a divulgação de posicionamentos em defesa da conservação da natureza brasileira. A Rede foi constituída em 2014, por iniciativa da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza.

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